trafegava com uma viatura da polícia a minha frente e um carro da CET atrás > sabes bem: não tenho carteira > não achei ruim, porque, de certa forma, estar cercada pela lei poderia me manter longe de acidentes > pararam violentamente, tiraram-me do carro à força - estavam armados - pagaram cervejas, deram-me conselhos > sim, amor, falaram de ti.
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Tô a fim de fazer um clone meu. Não deve ser coisa muito complexa hoje em dia. Talvez tivesse que esperar um pouco, mas nada que demorasse muito, pois tenho certa urgência. Tenho um amigo num laboratório da USP, que já incumbi de fazer umas pesquisas, tal. Entreguei a ele, num saquinho plástico, uma antiga tampa de canetas BIC, que durante muito tempo usei para limpar os ouvidos. Acredito que o objeto, depois de tanto tempo em contato com minhas secreções auditivas, seja o suficiente para um começo de tentativas, análises, estudos de seja lá o que for necessário para dar início ao projeto. O outro eu. No intuito de acrescentar algumas singelas alterações no dito cujo logo no início do processo, vou solicitá-las. Em se tratando de um projeto, que embora sendo uma cópia minha, pretende-se totalmente novo, nada mais justo do que pelo menos tentar essas pequenas alterações. Nada muito drástico e que fuja muito do original, afinal trata-se de um clone, e como tal, deve me substituir. Seriam duas pequenas alterações, só pra deixar o clone mais coerente e enxuto, se posso chamar assim. Ele poderia só ter o nariz um pouquinho menor e o pau um pouquinho maior que os originais. Claro, muito sutilmente, nada que destoasse visivelmente do seu original, no caso, eu. Tendo um clone à minha disposição, seria uma forma de dividir um pouco a sobrecarga de todas as atribuições que normalmente a vida me impõe. Claro, consciente das obrigações que me cumprem, não estou aqui querendo simplesmente me eximir delas. Apenas acho que seria uma forma de conseguir um pouco mais de descanso, e não me refiro apenas ao esgotamento físico, natural com o passar do tempo, mas talvez principalmente ao repouso e refazimento mental. Imagino que um outro eu, nas atuais circunstâncias, seria de extrema utilidade e só me traria alegrias. Principalmente se viesse com essas pequenas alterações que pretendo. Seria magnífico. Imagina, um outro eu, que seria muito mais útil e faria muito mais sucesso do que o original, modéstia a parte, já faz. Seria de extrema utilidade nos momentos, por exemplo, em que quero ficar preguiçosamente em casa à noite, simplesmente vendo TV, ouvindo música ou mesmo escrevendo. Esta cópia mais perfeita de mim mesmo sairia por mim nestas ocasiões. Poderia cumprir facilmente uma agenda social, visando claro, meus interesses, de quem mais? E nem poderiam, os mais conservadores e puristas, me acusarem de abuso de poder, ou escravidão, posto que ele mesmo seria um outro eu. E ele (ou eu) só teria vantagens. Além daquelas que já mencionei, ele aproveitaria todos os momentos de prazer que eu, por alguma razão, não estivesse disposto a desfrutar naquele momento. Ou tivesse coisa bem melhor a fazer, claro. Um clone só me traria vantagens. Além dos eventos sociais, ele poderia ir fazer um trabalho, por exemplo, enquanto eu ficasse em casa, executando outro. Poderia ir na academia por mim, num dia que eu quisesse ir à praia. Poderia ir ouvir o desabafo aquele amigo que me solicitasse algumas horas de atenção, enquanto eu ia tomar chopp com outro amigo e só falar merda, por exemplo. Claro que estes amigos não poderiam se falar depois, ou menos ainda, se telefonarem nestes momentos. Já pensou? Ambos dizendo estar comigo, em situações tão diferentes? São só vantagens. Só de pensar já torna mais firme a minha convicção de que um clone é tudo o que preciso neste momento. São muitas atribuições, solicitações e coisas que quero fazer e conquistar. E convenhamos, um outro, um pouquinho mais perfeito que eu, só teria a acrescentar nas minhas conquistas de vida.
De que me interessaria esta TV sem som à beira da calçada? Nada, se só o que vejo agora é a sua blusa xadrez se abrindo para as minhas mãos. Penso que você poderia baixar amanhã no hospital, tamanha a minha vontade de provar que posso deixar marcas que te levariam ao PS mais próximo, num domingo à tarde.
Leo não consegue mudar o mundo
Porque o mundo não comporta a fantasia de Leo
Porque Leo não aprendeu a real
Leo pensa que o mundo é bom
Leo pensa que o mundo ama a gente
Leo pinta, rabisca, desenha
Escreve tudo o que queria
que o mundo fosse
O mundo não conhece a alma de Leo
Porque Leo tem várias
E nenhuma delas do mundo
E nenhuma delas aceitáveis
Porque Leo não sabe viver mentindo
E por isso o mundo não entende Leo
Mas Leo entende o mundo
E por isso é pena viver nele
Leo pinta, rabisca, desenha
Escreve o mundo azul de novo
Porque Leo sabe que o mundo
há muito tempo deixou de ser azul
Se um dia o mundo parasse e olhasse para Leo
talvez o mundo mudasse
Então Leo não precisaria mais se esconder
Nem pintar, desenhar, escrever
Mas aí Leo deixaria de acreditar
E se isso acontecesse
então coitado do mundo
Ele jamais conheceria a alma de Leo.
Porque o mundo não comporta a fantasia de Leo
Porque Leo não aprendeu a real
Leo pensa que o mundo é bom
Leo pensa que o mundo ama a gente
Leo pinta, rabisca, desenha
Escreve tudo o que queria
que o mundo fosse
O mundo não conhece a alma de Leo
Porque Leo tem várias
E nenhuma delas do mundo
E nenhuma delas aceitáveis
Porque Leo não sabe viver mentindo
E por isso o mundo não entende Leo
Mas Leo entende o mundo
E por isso é pena viver nele
Leo pinta, rabisca, desenha
Escreve o mundo azul de novo
Porque Leo sabe que o mundo
há muito tempo deixou de ser azul
Se um dia o mundo parasse e olhasse para Leo
talvez o mundo mudasse
Então Leo não precisaria mais se esconder
Nem pintar, desenhar, escrever
Mas aí Leo deixaria de acreditar
E se isso acontecesse
então coitado do mundo
Ele jamais conheceria a alma de Leo.
Ultimamente, e isso acontece quando demoro muito a voltar, tenho tido um certo estranhamento em relação ao Rio. Nem tão aprazível assim, balneáreo onde eu naisci. Não escrevi errado não, apenas pontuo a pronúncia carioca ao verbo nasci. Aliás o medo de escrever errado também, ultimamente, tem se mostrado um martírio. Outro. Explico o estranhamento: é como aquela sensação que se tem quando observa-se grandes aviões taxiando na pista antes de voar. Os grandes, os vôos internacionais, os vôos sem volta, alguns. Porque também é normal não voltar. Tenho lido muito, tentado muito e constatado muitíssimo. Aprendi muito nos últimos meses em que não voltei ao Rio. Forço-me aqui. Forço-me no exílio e não me refiro somente ao estado de nascença, não. É um exílio por vezes muito pior e mais profundo e mais cruel do que apenas não pegar um vôo. Tem uma crônica, ou tragédia, ainda não sei, carioca, que insiste em não sair. Me pego emaranhado na história do Cosme Velho, que testemunhei a tantos anos atrás e que tento agora, reproduzir. Mas o Rio me trai de volta. Ele não perdoa a minha traição de amante sacana, que fode pra doer, porque sabe que assim o faz melhor. E que assim se faz inesquecível. Porque o que dói não se esquece, por vezes até se ama. Loucamente. O Rio não me perdoa e não me entrega de bandeja nas mãos a história que quero contar. Porque enlouquecer, ultimamente, tem sido tão prazeroso quanto elucidativo. E isso me faz melhor. Cruelmente melhor, embora não me impeça de sofrer. Pois eu prometo te enfrentar, e sim, perdoar a sua marra tão típica. Porque quem não perdoa adoece. E eu queria tanto que você me visse assim, feliz e crescido e coerente. Meu Deus, enfim coerente. Eu queria tanto que doesse em você algo escrito por mim. Tanto ou mais do que dói em mim mesmo. Eu prometo te enfrentar e declarar meu amor de amante arrependido. Eu prometo arrancar de você a história que me deve. Porque nós dois, velhos sacanas, merecemos.
- Deste céu bizarro e nevoento,
Convulso como o teu destino,
À tua alma que pensamento
Desce? Responde, libertino.
- Insaciavelmente sedento
Do que não vejo e não defino,
Reprovo a Ovídio o seu lamento
Quando se foi do Éden latino.
Céus destroçados e tristonhos,
De vós o meu orgulho é fruto;
Vossas grossas nuvens de luto
São os esquifes de meus sonhos,
E vosso espectro a imagem traz
Do Inferno que à minha alma praz.
Charles Baudelaire
Convulso como o teu destino,
À tua alma que pensamento
Desce? Responde, libertino.
- Insaciavelmente sedento
Do que não vejo e não defino,
Reprovo a Ovídio o seu lamento
Quando se foi do Éden latino.
Céus destroçados e tristonhos,
De vós o meu orgulho é fruto;
Vossas grossas nuvens de luto
São os esquifes de meus sonhos,
E vosso espectro a imagem traz
Do Inferno que à minha alma praz.
Charles Baudelaire
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