Em 2005 o diretor Jacques Audiard realizou o filme De Tanto Bater Meu Coração Parou, que contava a história de um rapaz de 28 anos em um momento divisor de águas: seguir o caminho corrupto do pai, ou o lado virtuoso da mãe, pianista. Na maior parte do filme, vê-se este protagonista numa luta constante entre livrar-se da influência negativa do pai e entregar-se ao talento herdado da mãe. É um filme de violência plástica, cenas luminosas e música clássica, numa Paris colorida e musical. Corta para o rosto de César Luciani (Niels Arestrup), espumando o seu ódio diante de Malik El Djebana (Tahar Rahim), o jovem árabe que ele toma como seu protegido e ascecla. Niels Arestrup é o mesmo pai de De Tanto Bater, aqui num desenho magistral do mafioso e líder corsa, César Luciani. Malik é preso condenado à seis anos, em circunstâncias não muito explicadas. Sem “origem”, sem parentes, nem passado, é jogado numa cadeia dividida entre as facções dos árabes “sujos” e dos ítalo-franceses, liderados por Luciani. Talvez necessite assistir novamente à O Profeta. Não é um filme de fácil aceitação e muito menos digestão. É um filme sem heróis, ou antes, de muitos heróis. O fato é que, levados pela direção de Jacques Audiard, não conseguimos uma empatia com seu protagonista e principal “herói” desta jornada. Talvez eu tenha pecado em, na falta deste herói, ter-me detido à interpretação do incrível Niels Arestrup. É o tipo de composição de personagem em que quase pode-se sentir o cheiro de sua persona, tamanha é a veracidade que o ator consegue nestes casos. E sem dúvida, o cínico mafioso é um legítimo representante desta classe. Mas voltando ao protagonista anti-herói Malik, assistimos sua escalada dentro de uma organização (a ítalo-francesa), sem esquecer sua origem árabe. Aprendendo com seu protetor e master bandidão César Luciani, o jovem Malik rapidamente absorve o cinismo como única forma de sobreviver entre os dois mundos, e o pior, dentro de um espaço exíguo que é a prisão. Talvez não torçamos prontamente por Malik. Seu desenho e direção é composto justamente pra isso. Mérito de direção e roteiro. Mas aos poucos assistimos seu desfile fluídico entre aquelas paredes e aqueles homens já condenados por si próprios, como uma espécie de mérito alcançado por seu próprio esforço. Talvez Malik seja o único ali dentro que, apesar das circunstâncias, não se deixa entregar à sua condenação íntima, e em nenhum momento ele esmorece ou se considera sem salvação. Para sobreviver ele será capaz de tudo, matar sim, morrer jamais. Quero destacar a ambientação da prisão, que nos remete aos filmes de gângsters tão comum aos americanos, nos anos 70. Sem a sua plasticidade ascéptica, o que convenhamos, é muito mais interessante e próximo ao real, e em O Profeta, de suma importância para coerência da sua trama e tipos. E a já famosa “cena da gilette”, que antes mesmo de acontecer propriamente, nos oprime nos simples ensaios em que ela se prepara. Sem obviamente entregar a trama, destaco o talento do cinema europeu no que diz respeito às cenas de mortes violentas, mais uma vez se sobrepondo aos californianos. A morte violenta não é um balé a ser coreografado. Não tem que ser bela e sim coerente com a história e pano de fundo na qual são contadas. E nisso também o cinema francês se sobrepõe ao americano. Vide outra cena de morte, no filme Caché: surpreendente, chocante, verdadeira. Mas Jacques Audiard não quer chocar com o seu Profeta. Antes, prefere a discussão que o seu múltiplo personagem central nos oferece. Por isso assistí-lo mais de uma vez, para talvez decifrá-lo. Talvez, o que pode na realidade, jamais acontecer.
4.8.10
Olha, criticando filmes! Então, gostei de vários elementos da crítica e não gostei de alguns. Se quiser, depois te falo o que poderia tirar/incluir. (Estou me sentindo o Merten, né? kkk) Bjo, queridão. Tem futuro.