Senta aí, vai. Me conta. Larga este cigarro que eu te dou um café. Quê? Cada um com seu vício? Ok, eu pedi pra ouvir isso. O que são estas mãos sempre raladas, pô. Tem sempre um machucado em você. Incrível isto. Desde que te conheço, é um dedo quebrado, um pulso aberto, um corte na testa. Caralho, você se machuca demais. Por dentro, né? É pior, eu sei. Mas escuta, juro que não é sermão de irmão mais velho, nem de pai careta, opressor. Mas aonde você vai assim com tanta pressa e tão sem medo? Olha, se tem um troço que odeio é medo, te juro. Mas pô, tem uns momentos até que ele te protege, te preserva. Você não pode ser tão destemido assim. É um risco de vida, até. Quê? Você é livre? Porra, eu sei disso. Como sei... e te admiro, viu. Mas caramba, tenta pegar mais leve. É a tua vida, poxa. Não brinca com isso. Tá frio hoje, toma este vinho barato, que é bem a tua cara... É uma fúria, uma energia que sai de você que salvem-se quem puder e quem tiver na tua frente. Eu sei que na tua idade é isso mesmo. Muito tesão por tudo e por todos. Mas você tem maturidade. Tem caráter. E na boa, eu acho que é isso que te salva. Tem muita gente que gosta de você e quem não te conhece, quando bate o olho saca que ali tem alguém especial. Tua energia conquista. Teu coração aprisiona. É foda. O seu poder é foda. Grande, viu. Gosto muito de ti e tem uma galera grande junto comigo. E é só por isso que tô te dando este toque. Eu sei que tua vontade é de engolir o mundo inteiro numa bocada só. E cê tá certo, tem que ter tesão pela vida mesmo. Mas por isso mesmo é preciso cuidar dela. Agarrar-se à ela com unhas e dentes. Os que você ainda tem, né?! Tô brincando... Seguinte, o que quer que esteja te angustiando, bota pra fora. Fala, pô. Tem um monte de gente que gosta de você, já disse. Vai curtir, vai. Vai curtir o que você tem pra curtir, porque você tem uma vida inteira pela frente. Mas pra isso, cê precisa se cuidar. Engole o mundo, abraça todos, como você tanto gosta. Mas nestes abraços, fica um pouquinho mais em cada um deles. Respira, conta até dez. Fecha os olhos. E acredite, a vida é nosso bem mais precioso. E a gente tem responsabilidade sobre ela, sim. É uma dádiva que a gente não se dá conta. Vai curtir, vai. Tem uma festa lá fora te esperando. Ela tá parada, cara, só esperando você chegar. Vai lá, vai com toda tua força. Todo o poder que você tem. O mundo inteiro te espera. Mas lembra que pra você aproveitar ele todo, até o fim, você precisa estar vivo. Vivo! E isso é uma responsabilidade só tua. É um dever que não cabe a mais ninguém, só a você. E sobre aquele lance do medo, pensa só um pouquinho, vai. Um medinho pequeno, se você permite. Aquele que vai talvez te bancar, te segurar quando você tiver afim de se lançar sem bóia ou sem prancha naquela onda gigantesca. O medo que não é absolutamente falta de coragem, entenda. Talvez seja só aquilo que vai te proteger da tua louca e insana juventude.
– Este post é por Lucas França, que faleceu no dia 23 de maio de 2008. Um grande cara, que amava todo mundo e não tinha medo de nada.