Parte I
Ele tinha os braços muito finos. E muito brancos. Diferentemente do restante dos homens da família, sua estatura era pequena. Isso lhe dava um aspecto mais jovem do que ele realmente era. Próximo dos dezoito, não aparentava mais do que quinze anos. Já nasceu com este corpo frágil - Seu pai sempre repetia, lamentando-se. Levara muitos tombos na infância, parecia não se equilibrar corretamente sobre as pernas miúdas. Carregava desta época, uma marca acima da sombrancelha esquerda. Uma pequena cicatriz, de pouco mais de dois centímetros, dando-lhe um semblante, com os olhos e os cabelos muito pretos, de um pesar, que parecia estar ele sempre prestes a chorar. Embora não parecesse um tolo chorão. Longe disso. O seu iminente choro, parecia antes ser de ódio. E talvez isto lhe emoldurasse os olhos, tal qual uma máscara, que ao invés de esconder, revelava o seu interior. A sua aura era de um demônio enfurecido, aprisionado num corpo frágil de menino. Um ódio, misto de tédio, como um leão nascido na jaula.
Antes de morrer no parto, deixando-o só com a irmã e o pai, sua mãe já desejara o seu nome. O velho acatara assim, o desejo da morta. Mas para a família, ele nunca fora conhecido pelos nomes primeiros. Já no berço, projetado especialmente para ele, ao receber as primeiras visitas, todos que o adulavam, logo se referiam a ele, usando o sobrenome da família, como o jovem Valentino. Fosse pela sua frágil figura, fosse por ter sido o seu nascimento, o motivo da morte da mãe, a verdade é que seu pai, mantinha-se distante dele, o máximo que podia. Nitidamente suas atenções e afetos se voltavam para a filha, apenas dois anos mais velha que o menino. Cresceram assim os irmãos, inseparáveis pelo carinho recíproco que dedicavam um ao outro e separados no coração do pai. Apesar da pouca diferença de idade, Valentino tinha na irmã, uma figura materna, suprindo a natural carência da mãe, que os empregados diziam, entre cochichos pelos corredores e pátios, ter morrido por causa dele. Ele sempre o soubera. No íntimo e silencioso coração do pequeno Valentino, a culpa inevitavelmente, crescia junto com ele, gerando tal estado de alma, que refletia em seu físico, tornando frágil o seu organismo, sujeitando-o às doenças comuns da infância, as quais ele sofrera quase todas. A irmã, sempre presente, não se furtava aos cuidados e a companhia que o caçula exigia, sendo ela a primeira a socorrê-lo e interceder por ele, junto ao pai, sempre distante. Estranha e inseparável figura formavam o casal de irmãos. Ela, sempre luminosa, saudável, feliz. Ele, soturno, frágil e sempre vestido de negro.
Era comum desde a infância, o modo como a irmã o acordava, dispensando os empregados desta tarefa: Com a ponta dos dedos, ela acariciava a pequena cicatriz na sua testa e o chamava baixinho, ao ouvido, pelo sobrenome – Valentino… Apenas isto, e era o suficiente para que ele despertasse instantâneamente do mais profundo sono em que se encontrasse. Sem espanto, sem alarde. E por isso e apenas neste momento do dia, via-se sorrir o jovem Valentino. Houve porém, certa manhã, mais cedo que o habitual, em que ela fora acordá-lo, como sempre o fazia. Mas neste dia havia algo nela que ele percebeu diferente, embora não soubesse distinguir. Era uma felicidade contida, diferente da exuberante alegria que ela sempre trazia. Ele estranha, embora não a questione. Mas ela explica, como se falasse para si mesma a razão do sentimento que quase a fazia explodir. Sem que ninguém do restante da família soubesse, incluindo ele, Valentino, seu pai autorizara um noivado, uma promessa de compromisso entre sua irmã e um primo distante, da parte da família de sua mãe. Há meses corriam os arranjos e acordos entre os parentes, sem que ela nada o contasse. Nem nos momentos de mais intimidade e solidão entre eles, o que era muito habitual. Há meses, ela dizia, e nenhuma palavra a ele. Justificava-se agora, a menina, dizendo ter sido uma imposição do pai, a fim de melhor orientar o primo e os parentes, em relação à mais nova união entre as duas famílias. Ela exultava. Sequer percebia no irmão qualquer reprovação à boa nova que lhe trazia, tamanha era a sinceridade nas suas palavras. Emocionada, ela toma-lhe as mãos pequenas, como a pedir-lhe uma alegria tão condizente com a sua. Mas a única impressão que ela recebe dele, são breves palavras:
– Agora então, será apenas entre ele e eu.
2.2.09
Diga-me teu nome, e confirmarei que sei sobre ti.
2.2.09
Parabéns pelo texto. Definindo em uma palavra: "elaboradíssimo"! Abraço!
2.2.09
Cadê o capítulo II? Cadê o capítulo II?
rsrsrsrsrs
Adorei!!!
3.2.09
Muito bom texto, parabéns.
Cadê a continuação?
3.2.09
E o Oscar vai para...
Abraço!