A cadeira amarela


Eu sempre gostei daquela cadeira amarela
que você mesma havia pintado
Houve um tempo em que até pensei que a ganharia de presente
Mas nem passava pela sua cabeça me dar a cadeira amarela

Depois, você até a reproduziu num quadro, igualzinha a original
Pintava este quadro, com a cadeira amarela, pra uma amiga que também gostava muito dela
Eu, que sempre gostava das coisas que você pintava, pensei também
que talvez até ganhasse o quadro da cadeira amarela
Mas não, nem passava pela sua cabeça desapontar sua amiga

Você tava esvaziando a casa, se livrando de coisas inúteis
ou que não te agradavam mais
Seria bom ter só o que se pudesse carregar, você dizia
Eu pesava pouco essa época, tava magrinho, magrinho
Ficava muito tempo sentado na cadeira amarela,
olhando o quadro da cadeira amarela
Ele tinha um fundo azul cobalto, seu preferido e um chão xadrez
A cozinha da sua amiga tinha o chão xadrez, eu ria,
nem cozinha eu tinha, direito

A casa tava quase vazia agora, quase tanto quanto eu
Haviam só umas pequenas caixas de documentos
Uns pedaços quebrados de saudade
Algumas almofadas, umas palavras meio sem nexo que ainda saiam
Uns papéis espalhados pelo chão
Umas poucas lágrimas que nem tinham muita vontade de sair

Lembro que a cadeira amarela ainda ficou lá, por um bom tempo
Foi uma das últimas coisas que você retirou do apartamento
Eu ficava por lá também, eu e ela as vezes, só os dois
Eu a admirando, olhar de apaixonado e ela impassível
Talvez competíssemos, sem saber
Talvez esperássemos por respostas

Iríamos embora juntos, eu e ela?
Iríamos embora cada um pro seu lado?
Iríamos embora cada um no seu caminho?

Depois eu soube que ela tinha ficado muito bem sobre o chão xadrez.

0 Response to "A cadeira amarela"