Chico Ribas, com sua sensibilidade mais cortante que uma espada de Hattori Zanza, me inspirou ao mencionar Tennessee Williams em seu Blog. Dramaturgo norte-americano, famoso por clássicos como Um Bonde Chamado Desejo, entre outros. Com obras que serviram de base para diversas versões cinematográficas, seus dramas transmitem sempre uma impressão pessimista, com a freqüente presença de personagens psicopatas, incapazes de encontrar o seu lugar na sociedade. Separo aqui duas imagens de uma de suas obras mais conhecidas, Gata em Teto de Zinco Quente (1955). Um cartaz da famosa versão levada às telas e a capa de uma publicação com suas peças.
Tennessee Williams
(Dramaturgo e escritor norte-americano)
26-3-1911, Columbus, Mississípi
25-2-1983, Nova York
Tennessee Williams
(Dramaturgo e escritor norte-americano)
26-3-1911, Columbus, Mississípi
25-2-1983, Nova York
Hoje ao voltar pra casa vou lembrar que não há mais você lá e ficar feliz com isso. Mais do que isso. Vou ser tomado por uma felicidade tão absurda e irreal quanto a que sempre desejei. Será uma espécie de outro voltando pra casa. Um homem diferente do que saiu, pela manhã. Um homem diferente, tanto quanto você sempre desejou. Hoje volto diferente mas você não vai estar lá para ver. O homem diferente de hoje não é necessariamente o que você desejou. Não sei se ele é pior ou melhor. Mas é fato que é outro. E é fato que ele é mais feliz. Hoje ao voltar pra casa, mais aliviado, vou olhar para a janela da sala, ainda na rua, como sempre faço e verei as luzes apagadas. Não há ninguém em casa. Tampouco ela será a mesma sem os seus antigos moradores. Porque hoje é um estranho que vai virar as chaves na porta, acender as luzes, olhar os peixes do aquário, abrir as janelas e deixar o vento entrar. Hoje, um estranho vai sentar na poltrona que fica próxima a janela e não vai ter que esperar a qualquer momento a porta abrir e ouvir seus passos apressados entrando. A sua mão tocando seu ombro e perguntando qualquer coisa que ele não quer mais ouvir. Nem responder. Vai poder acender um cigarro e não ter nenhuma vontade de fumar. Vai poder olhar pela janela, sem recriminações e ver as pessoas passarem na rua. Hoje são tantas. Hoje são as mesmas. Mas são outras.
– Veja no link o making of desta foto feita para anúncio da Adobe, por ocasião de lançamento da versão CS4 do software.
Art Snob Solutions @ Flickr
"Capriche na gentileza e na simpatia, pois todos com quem você se esbarra, sem exceção, estão travando suas próprias batalhas”.
da Folha Online
Era um homem cordial. Fazia questão disso. Adorava ser educado, usar palavras gentis, dar preferência, ter compostura. Adorava a palavra compostura.
Na fila do banco, do supermercado, numa loja, na padaria, sempre olhava para ver se tinha algum idoso, alguma mulher, uma grávida quem sabe, com quem pudesse ser gentil, a quem pudesse ceder a vez.
No trânsito, costumava ser insultado com freqüência, porque vivia deixando qualquer um passar na frente, esperava aquela velhinha atrapalhada estacionar sem pressa, nem chegava perto dos motoboys, parava no sinal ainda amarelo, nunca ultrapassava a velocidade permitida. "Sai da frente, mané! Roda presa!", ouvia, e deixava para lá, com um sorriso superior, de quem sabia exatamente o que estava fazendo e fazia exatamente o que queria fazer: ser correto, gentil, sem estresse, tentando provar para ele mesmo, para sua família e para o mundo que, sim, o homem é basicamente bom. E o brasileiro, particularmente, é cordial, o Sergio Buarque de Hollanda estava certo...
Houve um dia que chegou ao cúmulo de esperar mais de uma hora no aeroporto porque não agüentou assistir ao bate-boca entre um passageiro que perdera o vôo e o atendente, ambos explodindo de irritação. Para acabar com aquele "clima ruim", cedeu seu lugar para o Rio de Janeiro. "Vou no próximo, é ponte aérea, não demora nada", afirmou para interlocutores totalmente atônitos.
Não que esperasse alguma coisa em troca da sua gentileza. Já tinha ouvido falar do tal profeta do Rio, aquele que dizia que "gentileza gera gentileza", mas nem com relação a isso alimentava muita expectativa. Agia dessa maneira simplesmente porque achava correto.
Como achava correto dar bom dia e boa tarde, apertar o botão do elevador para os demais passageiros, abrir a porta do carro para as mulheres.
Também não achava correto fechar o vidro na cara daqueles maltrapilhos que vinham pedir esmola no semáforo ali na esquina da sua casa. Até conhecia alguns, sempre dava uns trocados, por isso não estranhou quando o homem se aproximou com a cabeça coberta por um cobertor imundo e encostou no carro, como que pretendendo limpar o pára brisa, com um paninho mais imundo ainda. Abriu o vidro apenas para dizer que não precisava limpar o vidro, que de fato não seria limpo mesmo, porque iria dar a moeda para o homem de qualquer jeito.
Não deu tempo de dizer nada, porque por debaixo do cobertor surgiu a outra mão do homem, com um caco de garrafa pontiagudo.
O corte pegou da boca até a orelha, quase talhando a jugular, passando perto do olho.
Conseguiu chegar ao hospital tempo de estancar a hemorragia, levou dezenas de pontos, quase sucumbiu a uma infecção, mas já está em casa, sem poder falar.
É meio perversa a minha curiosidade, mas queria saber o que ele pensa agora a respeito da cordialidade.
É difícil saber qual é o limite da bondade (e da maldade) humana.
Luiz Caversan, 52, é jornalista, produtor cultural e consultor na área de comunicação corporativa.
Era um homem cordial. Fazia questão disso. Adorava ser educado, usar palavras gentis, dar preferência, ter compostura. Adorava a palavra compostura.
Na fila do banco, do supermercado, numa loja, na padaria, sempre olhava para ver se tinha algum idoso, alguma mulher, uma grávida quem sabe, com quem pudesse ser gentil, a quem pudesse ceder a vez.
No trânsito, costumava ser insultado com freqüência, porque vivia deixando qualquer um passar na frente, esperava aquela velhinha atrapalhada estacionar sem pressa, nem chegava perto dos motoboys, parava no sinal ainda amarelo, nunca ultrapassava a velocidade permitida. "Sai da frente, mané! Roda presa!", ouvia, e deixava para lá, com um sorriso superior, de quem sabia exatamente o que estava fazendo e fazia exatamente o que queria fazer: ser correto, gentil, sem estresse, tentando provar para ele mesmo, para sua família e para o mundo que, sim, o homem é basicamente bom. E o brasileiro, particularmente, é cordial, o Sergio Buarque de Hollanda estava certo...
Houve um dia que chegou ao cúmulo de esperar mais de uma hora no aeroporto porque não agüentou assistir ao bate-boca entre um passageiro que perdera o vôo e o atendente, ambos explodindo de irritação. Para acabar com aquele "clima ruim", cedeu seu lugar para o Rio de Janeiro. "Vou no próximo, é ponte aérea, não demora nada", afirmou para interlocutores totalmente atônitos.
Não que esperasse alguma coisa em troca da sua gentileza. Já tinha ouvido falar do tal profeta do Rio, aquele que dizia que "gentileza gera gentileza", mas nem com relação a isso alimentava muita expectativa. Agia dessa maneira simplesmente porque achava correto.
Como achava correto dar bom dia e boa tarde, apertar o botão do elevador para os demais passageiros, abrir a porta do carro para as mulheres.
Também não achava correto fechar o vidro na cara daqueles maltrapilhos que vinham pedir esmola no semáforo ali na esquina da sua casa. Até conhecia alguns, sempre dava uns trocados, por isso não estranhou quando o homem se aproximou com a cabeça coberta por um cobertor imundo e encostou no carro, como que pretendendo limpar o pára brisa, com um paninho mais imundo ainda. Abriu o vidro apenas para dizer que não precisava limpar o vidro, que de fato não seria limpo mesmo, porque iria dar a moeda para o homem de qualquer jeito.
Não deu tempo de dizer nada, porque por debaixo do cobertor surgiu a outra mão do homem, com um caco de garrafa pontiagudo.
O corte pegou da boca até a orelha, quase talhando a jugular, passando perto do olho.
Conseguiu chegar ao hospital tempo de estancar a hemorragia, levou dezenas de pontos, quase sucumbiu a uma infecção, mas já está em casa, sem poder falar.
É meio perversa a minha curiosidade, mas queria saber o que ele pensa agora a respeito da cordialidade.
É difícil saber qual é o limite da bondade (e da maldade) humana.
Luiz Caversan, 52, é jornalista, produtor cultural e consultor na área de comunicação corporativa.
Quando tem coisas pendentes dependendo de datas e dias por delitos impensados e bombas que foram lançadas no seu quintal sem explodirem, você fica assim. A sensação de que há muitas coisas a resolver no horário comercial mas que não vai dar tempo de sair a tempo de ainda pegar o banco aberto. E o dia passa muito, muito lento. E você passa por ele bufando. Tentando expelir. Tentando se livrar. Mas se não se resolve não se livra. E o dia passa. E você deseja com toda a força da sua vontade acordar de novo naquela antiga casa amarela da sua tia onde tinha um quintal grande com infinitos varais de roupas cheios de lençóis e os pés de jabuticaba todos carregados e você acordava e corria pelo grande quintal, vencia os lençóis que voavam todos na sua direção e chegava, ainda tonto de sono à primeira jaboticabeira que estivesse ao seu alcance. Trepado ali o seu dia começava.
Tem aquelas pessoas de quem você não gosta. Tem aquelas pessoas que não gostam de você. Tem aquelas pessoas de quem você gosta e não pode estar. Tem aquelas pessoas que gostam de você mas isso não muda nada. Significa muito. Mas não muda nada. Todas as pessoas tão por aí e elas tão tentando se encontrar. Às vezes conseguem. Mas na maioria das vezes não. Porque é assim mesmo. Todas as pessoas tão na luta e tentando não enlouquecer. E tentando se entender. Tem muitas pessoas de quem eu gosto. Mas não entendo. Tem pessoas que me entendem. Mas que gostam de mim. E isso muda todo o entendimento. Enquanto tantas pessoas ultrapassam qualquer entendimento. Apesar daquelas pessoas que gostam de mim, eu ainda acho que tô melhor sozinho. Funciono melhor assim. Embora muitas pessoas não entendam. Mas eu não tô pedindo entendimento. Tô pedindo pra continuarem assim. E eu também.
Mais um álbum de Calvin e Haroldo é reeditado no Brasil.
O nome do álbum sugere ficção científica: "Criaturas Bizarras de Outro Planeta". Mas, na verdade, há poucos seres interplanetários nessa coletânea de tiras de Calvin e Haroldo, que ganha nova edição no Brasil (Conrad, 128 págs., R$ 33,90).
– Do blog dos Quadrinhos http://blogdosquadrinhos.blog.uol.com.br/
Era o ar gelado ainda, da madrugada que se transforma em dia, num início de manhã que prenunciava sol. Raios laranjas começavam a cair sobre a areia molhada pelas ondas e um vento frio trazia a maresia pra restinga rasteira, próxima a estrada, onde ela parava o carro, encostado-o próximo a uma cerca velha. Tinha um silêncio de morte sendo rompido pelo som das ondas que quebravam na areia alaranjada. Um som contínuo, vivo, bravio. Uma após outra, como um batimento cardíaco. Os batimentos das ondas na areia. Ela pensou na eternidade daquele som. Um coração que batia antes do dela existir e continuaria após o dela cessar. Ficou um tempo lá dentro, com os faróis ainda acesos, olhando aquele cenário alaranjado que ultrapassava a areia e chegava até a beira da estrada. Abriu as janelas do carro e sentiu o ar gelado que vinha da praia, naquela hora da manhã. Acendeu um cigarro e saiu do carro, esquecendo de apagar os faróis. Tinha um Anum pousado na cerca velha, que olhou pra ela enquanto se aproximava da restinga. Tirou as sandálias e sentou na cerca. O vento levantava seus cabelos e também a fumaça do cigarro. Ela olhou o pássaro, intrigada por ele não ter levantado vôo com a sua aproximação. Sentada na velha cerca, olhando aquelas ondas gigantescas estourando na areia, ela podia sentir o poder que vinha daquele mar tão gigante, tão fascinante e tão assustador. O sol, que agora já ia alto sobre a praia, começava a aquecer seu rosto e o pequeno Anum preto finalmente levanta vôo. Ela o segue com os olhos e observa que outro pássaro, aparentemente igual a ele, acabara de passar por eles, lá no alto. O Anum o seguia agora. Só por isso a deixara, ela pensou. Ela acompanha os dois, até finalmente sumirem do seu campo de visão. Se volta então para as ondas, que estouram violentas. Os batimentos das ondas na areia. Um desejo crescente de se juntar a elas. Para isso estava ali. Desce da cerca e caminha devagar entre as folhas rasteiras da restinga sem se preocupar com os pequenos espinhos que furam seus pés descalços. Ela quase não sente a dor. A que sente por dentro, esta sim, é muito maior. De repente, um som abafado, longe, mas familiar. Ela se volta. É o celular que toca dentro do carro. Reflete num segundo. Olha pro mar. Olha pro carro. O toque, de longe, insistente. Ela pensa por um instante. Se volta e continua, em direção as ondas. Não ouve mais o som de quem chama por ela. Não importa mais. Nem mesmo aquela luz, aquele céu, aquele mar, nem mesmo toda aquela vida explodindo nos seus sentidos, parece ser suficiente pra impedí-la de continuar a andar. Seus pés encontram agora a areia já molhada, quando, surgindo do nada, um cão, amarelo, cruza a sua frente, correndo. Late feliz para o dono, que o segue, logo atrás. Assustada, ela o vê aproximando-se devagar. Um homem. Um estranho, que passa por ela. Ele sorri e diz apenas bom dia. Eles passam. Seguem, o cão, latindo feliz, e o seu dono logo atrás. Ele ainda se vira pra ela, e de novo sorri. Ela olha novamente pro mar. As ondas estourando na areia. Olha pro carro, na beira da estrada. Olha pro homem e seu cão, seguindo pela areia já dourada, naquele começo de dia. Ela se volta, enfim e caminha.
O por do sol vai renovar brilhar de novo o seu sorriso
E libertar da areia preta e do arco-íris cor de sangue, cor de sangue, cor de sangue ...
O beijo meu vem com melado decorado cor de rosa
O sonho seu vem dos lugares mais distantes terras dos gigantes
Super Homem, super mosca
Super Carioca, super eu, super eu ...
Deixa tudo em forma é melhor não ser
Não tem mais perigo digo já não sei
Ela está comigo digo só não sei
O sol não advinha baby é magrelinha
O sol não adivinha baby é magrelinha
No coração do Brasil
No coração do Brasil
No coração, no coração
No coração do Brasil
No coração, no coração
Luiz Melodia
Minha noite é como um grande coração batendo (última parte)
"(...) Seu olhar é liso e desliza por todas as coisas. Minha noite quer que você esteja aqui para deslizar em você com ternura. Minha noite o espera. Meu corpo o espera. Minha noite quer que você repouse no meu ombro e que eu repouse no seu. Minha noite quer ser voyeur do seu gozo e do meu, ver você e me ver estremecer de prazer. Minha noite quer ver nossos olhares e ter nossos olhares cheios de desejo. Minha noite quer segurar nas mãos cada espasmo. Minha noite se faria suave. Minha noite geme em silêncio a solidão ao se lembrar de você. Minha noite é longa, muito longa. Perde a cabeça, mas não pode afastar de mim a sua imagem, não pode fazer desaparecer o meu desejo. Ela morre por saber que você não está aqui, e me mata. Minha noite o procura sem cessar. Meu corpo não consegue conceber que algumas ruas ou uma geografia qualquer nos separem. Meu corpo enlouquece de dor por não saber reconhecer no meio da minha noite a sua silhueta ou a sua sombra. Meu corpo gostaria de beijá-lo em seu sono. Meu corpo gostaria em plena noite de dormir e, nessas trevas, ser despertado com os seus beijos. Minha noite não conhece hoje sonho mais belo e mais cruel do que esse. Minha noite berra e rasga os seus véus, minha noite se choca contra o próprio silêncio, mas seu corpo continua impossível de ser encontrado. Você me faz tanta falta, tanta. E suas palavras. E sua cor. Logo o dia vai raiar."
(Carta a Diego ausente, Cidade do México, 12 de setembro de 1939. Não enviada)
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