Quando enfim sentirmos o cansaço supremo, então daremos conta do longe que sempre esteve tão perto quanto as possibilidades que a vontade nos permitia. Porque durante a vida nos acostumamos a fazer estes faz-de-conta, mesmo sabendo que no fundo não sabemos mesmo onde pode dar. Vemos os quilômetros da distância perderem facilmente para a distância das vontades. Quando enfim nos cansarmos de nos bastar, pode ser tarde. À espera de estarmos prontos, somos capazes de morrer mil vezes durante anos a fio, sem nunca ficarmos prontos. Nunca estaremos prontos. E o cansaço virá, indubitavelmente. E depois dele, quem poderá saber. Disse uma vez, sem tirar os olhos da tela, que era sua, amarela, o quanto tinha pra dizer, mas perdia-me diante da sua completa perdição, que eu confundia com magnificência. Talvez você tenha percebido meu engano e sorriu, amarelo, dizendo que o tempo se encarregaria de dizer tudo. Que me importava o tempo? Que me ajudaria o tempo? Queria eu mesmo naquele momento conseguir verbalizar toda a dolorosa felicidade que me explodia pela garganta. Queria vomitar tudo aquilo, só assim conseguiria uma plenitude tão grande como a sua me parecia. Não disse nada, embora tivesse todo o tempo para dizer. Não era capaz de dar conta daquela felicidade. Não saberia viver com ela, embora sem ela não conseguisse respirar direito para subir os degraus que levavam até aquela vila de casas, de plantas nas portas. Traz Coca-Cola, se vier. Não poderia, reconheço hoje. Há lá fora uma felicidade que não é minha. Havia naquela vila de casas uma felicidade que não poderíamos.
22.6.10
Esse texto vai pro capítulo 2 do livro tá? Abraço.