Um coração doente que não funciona mais, dando como única esperança a seu dono, um transplante. Pierre (Roman Duris) um ex-dançarino é o dono deste coração. O mesmo Roman que, coincidentemente, estrela outro filme, de nome De Tanto Bater Meu Coração Parou, de 2005. Solteiro e solitário, ele conta com a ajuda da irmã Elise (Juliette Binoche), sempre ela. Esta trama centraliza todas as outras que circulam em volta do drama dos dois irmãos, neste mais recente filme do diretor Cédric Klapisch, Paris. Sempre ela. A mesma Paris de tantos outros filmes incríveis e outros nem tanto, que nos fizeram sonhar e idolatrar os tão famosos antipáticos, franceses. Pierre, entediado e certo de que vai morrer, passa os dias na sacada de seu apartamento observando as pessoas e suas vidas, lá embaixo. Embora Cédric tenha feito brilhantemente uma teia a la Robert Altman, onde todas as histórias acabam por se cruzar, em maior ou menor intensidade, é a trama principal do filme a que mais me interessou.
Observando e analisando a vida nas ruas, Pierre tem a fala daqueles que por alguma comprovação ou diagnóstico, sabe que não tem muito tempo de vida, ou, pelo menos que para o seu mal não há cura. Passa a ser estranho para ele, olhar as pessoas vivendo, indo e vindo, seguindo suas vidas normalmente. Ele tem a solidão e o isolamento que só um diagnóstico como este pode dar. É um não fazer mais parte daquela vida que o atormenta, enquanto aguarda em repouso, o transplante que poderá lhe devolver a vida que tinha, ou não. No seu caso é 50% de chances, para um, ou para outro. A irmã, mais velha, vinda de relações que lhe deram filhos e infelicidade, soa a ele como um desperdício, uma vez que se entrega a uma vida apática, sem grandes aspirações e um total esquecimento de si mesma. Como na cena dos dois, na sacada, em que ele tenta, levado por sua angústia, trazê-la de volta a vida, uma vez que ela, em tese, ainda pode aproveitá-la. E não quer. Enquanto o contrário ocorre com ele. Soa como um diálogo entre um suicida e um condenado. Um quer desesperadamente viver. O outro, desesperadamente, deseja morrer. Ao condenado, resta o ultraje que a decisão do suicida lhe provoca. Ao suicida, cabe o repúdio a uma vida que não deseja mais. A vida que o condenado se agarraria, se pudesse.
Apesar disso, Paris está longe de ser um filme triste e arrastado. Mérito de Cédric, na minha opinião. O tempo inteiro ele nos oferece, através de suas histórias, alegres ou tristes, uma esperança. A mesma que Pierre não deveria perder, e que talvez não tenha realmente perdido. Paris está longe do considerado "normal" do cinemão hollywoodiano. Seja pelo seu ritmo de vai-vém das tramas, seja por fugir das linhas temporais a que estamos acostumados a ver no cinema. Por exemplo, o passar do tempo, que não se mostra claro para nós, a não ser por pequenos e sutis detalhes que o diretor apresenta. Paris é uma obra que vale ser vista por todos. Condenados ou não. Amantes da vida, e até mesmo os da morte. Porque apesar de todas as diferenças, pelo menos neste momento, todos temos algo em comum. A vida.
6.7.09
Um dia ainda conheço Paris. Suas pontes, seus bistrôs e suas ruas úmidas.