"Nós sabemos muito bem que os irmãos se odeiam desde que Caim matou Abel." Esta é uma observação do ator Walmor Chagas sobre seu personagem na segunda temporada da série Filhos do Carnaval. Tomazio Gebara, o irmão inválido de Anésio, que surge após a morte do patriarca da família com o propósito de se vingar de seus descendentes. Assisti a dois capítulos da primeira temporada, agora reprisada nas véspera da estréia da segunda, e fiquei impressionado com a qualidade da produção. Personagens tão complexos quanto verdadeiros, zero de esteriótipos, texto, enquadramentos (o velho clichê: parece cinema?!) Mais do que isso. É como gostaríamos que fossem as produções de ficção na TV brasileira. Por que não acabar de uma vez com as novelas, por exemplo, que surgiram aos borbotões após a entrada da Record na briga, e fazer tantas séries de ficção quantas a grana permitir? Mantendo-se a qualidade, pois é esta que difere uma da outra. Quem tiver HBO, recomendo não perder Filhos do Carnaval. Confesso que me impressionou.
Vou adaptar aqui a frase do velho Walmor: Nós sabemos muito bem que os irmãos se odeiam (e se amam) desde que Caim matou Abel. Acredito ser assim a relação entre irmãos. Partindo do mito de Caim e Abel, no qual o irmão enciumado mata o outro por ser preterido, percebo não ser só isso as relações entre irmãos. Como mito, a história dos irmãos bíblicos deve ser fatalista, pois requer representatividade, estigma. Mas a realidade é diferente. É de ódio e amor, na maioria das vezes. Por mais que hajam diferenças entre irmãos, personalidade, caráter, prevalece sempre a força da consangüinidade falando mais alto, ou mesmo superando estas diferenças. Claro que há os casos extremos (voltando ao mito) trágicos, mas mesmo nestes, analisando mais friamente, podemos perceber o quanto o parentesco é superior. Pois quem chega ao extremo de pôr fim a vida de um irmão, estará irremediavelmente condenado, antes de tudo, por si mesmo.
Pessoamente tenho alguns exemplos desta máxima, na qual os irmãos se unem, apesar das diferenças. Ninguém é a mesma pessoa durante a vida, isto não é novidade pra ninguém. E as vezes, aquele irmão distante, ou mesmo que não nos é simpático, mesmo este, pode nos surpreender quando "volta" sinceramente arrependido desta ou daquela forma que nos tratara anteriormente. Repito, ninguém é a mesma pessoa com o passar dos anos. E acredito que ninguém retrocede. Então, fatalmente devemos crescer, evoluir. E o que mais é o amor, senão a representação de algo sublime em nós, tão imperfeitos? Há ainda quem diga que os amigos são a família que escolhemos. Digo mais, os amigos (verdadeiros) são os irmãos não consagüineos que nos acompanham. Me considero um privilegiado por ter alguns assim. Pessoas que a exemplo de um irmão de sangue, podem voltar (se um dia tiver te deixado), podem te socorrer, e acima de tudo, podem te amar incondicionalmente, porque houve ali um encontro de almas, acima de qualquer outra convenção. O que na verdade, talvez explique a força que um irmão de sangue pode representar. Porque acima do parentesco físico, o que prevalece é a irmandade da alma. Mas isto é um outro mistério.